Berlim - A cidade das Bibliotecas - A devolução dos livros roubados - Parte 2
Apesar da documentação que detalhava a administração da biblioteca pública ter sido perdida, parte da correspondência relativa aos livros saqueados sobreviveu. Em 1943 a biblioteca pública de Berlim comprou cerca de 40 mil livros de uma casa de penhores para a qual enormes quantidades de obras haviam sido levadas depois de serem confiscadas das casas dos judeus deportados.
O registro de livros comprados em 1943 sobreviveu ao bombardeio, provando que o processo de compra de livros roubados continuou no pós-guerra. A biblioteca tinha perdido enormes quantidades de livros nos bombardeios e nos saques dos exércitos aliados (Exército Vermelho e outros). Depois da guerra, as bibliotecas tiveram confiscados os livros que houvessem pertencido a membros do partido, autoridades públicas, institutos de pesquisa e outras organizações do 3° Reich.
Os livros eram recolhidos pela Organização de Resgate para Bibliotecas Científicas, os livros eram etiquetados antes de serem redistribuídos para outras bibliotecas da cidade.
Livros com a etiqueta 13 vinha do Ministério da Propaganda de Goebbels, a etiqueta 7 representava livros vindos do Ministério da Aeronáutica de Goring, a etiqueta 4 vinha da biblioteca pessoal do ministro de Armamentos Albert Speer e com a etiqueta 5 vinha da casa do escritor alemão Walter Bloem.
Outras organizações que se envolveram nos saques de livros na Europa estavam representadas pelas etiquetas, como a de número 25 do Ministério Nacional para os Territórios Ocupados no Oriente de Alfred Roosenberg.
A biblioteca Pública de Berlim comprou muitos livros dessa organização, em parte porque o presidente da organização e o chefe da biblioteca eram amigos, comunistas que foram presos durante a guerra.
Roosenberg utilizou seu ministério para aumentar a sua influência, sob suas ordens funcionários iam para o leste para saquear bibliotecas e arquivos.
Depois da guerra muitos depósitos tinham sido saqueados pelo exército vermelho, inclusive o maior deles que servia ao Gabinete Central de Segurança controlado por Himmler.
Essa organização era célebre e contava com 60 mil funcionários que vigiavam e monitoravam os inimigos do Estado através de vários departamentos, entre eles a Gestapo e a SD.
E outro era a seção VII, o departamento de Pesquisa e Avaliação Ideológica fazia um mapeamento detalhado da atividade dos inimigos do estado e montou em um dos prédios confiscados uma enorme biblioteca vindos de toda a Europa. Estima-se que 3 milhões de livros tenham sido roubados e enviados para Berlim.
O objetivo dessa biblioteca era coletar livros, publicações e arquivos que pudessem auxiliar a SS e a SD a estudarem com profundidade os inimigos do país, judeus, bolcheviques, maçons, católicos, poloneses, homossexuais, ciganos, testemunhas de Jeová e outros grupos minoritários.
Como a biblioteca pública de Berlim etiquetava os livros com números, dependendo do lugar de origem, os bibliotecários Detlef e Finsterwalder conseguiram rastrear milhares deles. Mas a biblioteca também havia adquirido dezenas de milhares de livros de outras fontes após a guerra, e nesse caso eles não conseguiram encontrar suas origens.
Um dos livros identificados através da etiqueta e do selo ex-libris, é uma biografia do filósofo Baruch Spinoza, de 1790 que pertencia ao jornalista judeu alemão Ernst Feder, que após a chegada dos nazistas ao poder, fugiu para Paris e depois para o Brasil onde fez parte do círculo de Stefan Zweig no Rio de Janeiro.
Era raro que a Biblioteca Pública de Berlim adquirisse acervos completos, por isso a dificuldade dos bibliotecários em identificar as origens de um exemplar. Mesmo quando conseguiam estabelecer que o livro era roubado, nem sempre era possível saber como ele tinha chegado à biblioteca.
Em 2010 iniciou-se uma operação na Biblioteca Central de Berlim para identificar e devolver livros que tivessem sido saqueados, os bibliotecários Detlef e Finsterwalder junto com outros colegas examinaram manualmente cerca de 100 mil volumes. De acordo com a estimativa atual pode haver mais de 250 mil livros saqueados no acervo da biblioteca.
Em 2012 os bibliotecários começaram a trabalhar com um banco de dados com informações e imagens do livro roubado, e no qual é possível fazer buscas. O banco de dados permite busca pelo Google, muitas pessoas ao fazerem pesquisas genealógicas acabam tendo referência ao banco de dados, e assim todos os meses são devolvidos livros.
Atualmente o banco de dados contém 15 mil livros, esse projeto é apoiado pela prefeitura de Berlim e por uma organização federal que financia pesquisas genealógicas.
Mas nem tudo corre bem na cidade das bibliotecas, o nível de interesse nesse trabalho de resgate de livros saqueados, tanto por parte das autoridades quanto por parte das bibliotecas continua insignificante, e que a maior parte das bibliotecas e instituições da Alemanha tende a ignorar o tema.
De milhares de bibliotecas alemãs , apenas vinte investigaram seus acervos.
Entre 2009 e 2014, aproximadamente 500 livros foram devolvidos, muito pouco se lembrar que na biblioteca Central pode haver 250 mil livros roubados.
Os bibliotecários Detlef e Finsterwalder tem a esperança de que um dia seja possível identificar todos ele, mesmo parecendo uma vã ilusão.
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